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5 razões para nunca mais reprimir o choro

Atualizado em
  • “Engole o choro”
  • “Xiii, já vai começar a chorar?”
  • “Como você é chorona!”
  • “Homem que é homem não chora”
  • “Se não parar de chorar, você vai apanhar para chorar com motivo”

Se você já ouviu algumas dessas frases de seus pais na infância ou se já disse algo semelhante a seus filhos, esse texto é para você. Vou te dar 5 razões para nunca mais reprimir o choro.

Antes, vamos falar sobre o que a ciência diz sobre chorar e as interferências culturais nesse fenômeno.

O que a ciência diz sobre o choro emocional

Ad Vingerhoets, um psicólogo clínico holandês que estuda o choro humano há mais de 20 anos, encontrou algumas respostas interessantes sobre esse fenômeno que divide opiniões.

O autor não encontrou evidências que comprovem que chorar é saudável, entretanto, faço uma observação pessoal: embora não haja essa causalidade, isso não quer dizer que não seja importante chorar ou que chorar não tenha uma função positiva.

Segundo Ad Vingerhoets, chorar é um comportamento muito dinâmico, com um contínuo desenvolvimento que varia significativamente do nascimento à velhice e espelha apropriadamente importantes desenvolvimentos morais e socioemocionais.

Embora o choro possa acompanhar todas as emoções básicas, como chorar de raiva, de medo, de alegria ou de tristeza, nos humanos adultos, as principais causas do choro relacionam-se à impotência e ao desamparo.

luto ou a possibilidade de vivê-lo também são gatilhos para o choro emocional.

Situações positivas, como a construção de novos vínculos, também podem ser promovidas pelo choro. Inclusive, as performances artísticas excepcionais também podem fazer as lágrimas rolarem abundantemente.

Diferenças individuais do choro

Há consideráveis diferenças de choro entre indivíduos dependendo da idade, gênero, estrutura psicológica, cultura e exposição ao stress ou a situações traumáticas.

Para um entendimento adequado dessas diferenças individuais, há de se considerar quatro fatores:

  1. Diferentes exposições a situações emocionais 
    Situações emocionais percebidas como positivas ou negativas podem ter repercussões diferentes.

  2. Avaliação das situações
    Há locais, situações e pessoas em quem confiamos mais e há situações em que o choro não será bem acolhido. Essa avaliação é importante para saber a quem recorrer num momento de necessidade.

  3. As limitações ao choro
    Há situações em que o choro não é bem-vindo e pode ocasionar um resultado negativo, dependendo de como ele ocorre. Por exemplo: chorar em uma entrevista de emprego pode por tudo a perder se não houver uma boa justificativa para isso.

  4. Influências do aprendizado social
    Quanto mais somos acolhidos e respeitados em relação às nossas emoções e, especialmente, ao choro, mais nos sentiremos autorizados a fazê-lo quando sentirmos necessidade.

A expressão das emoções em nossa cultura

A cultura tem um grande impacto no chorar, embora isso provavelmente se limite aos contextos em que se chora em público (por exemplo, funerais e outros rituais, literatura, teatro, atividade religiosas, etc.).

Chorar privativamente é provavelmente mais universal e fortemente relacionados às questões de apego e sentimentos de desamparo.

Lágrimas emocionais são um poderoso sinalizador social raramente ignorado (que vai de muito positivo a extremamente negativo) e depende fortemente das características pessoais de quem chora e de quem observa, da situação específica em que o choro ocorre e da percepção da adequação das lágrimas à situação, como exemplifiquei com a entrevista de emprego.

Aqui no Brasil, embora sejamos um povo bastante emotivo, podemos ver as diferentes percepções relacionadas ao choro conforme o gênero, por exemplo.

Para a mulher, que tem questões hormonais envolvidas, o choro mais abundante, se por um lado, era mais aceito, por outro, também era utilizado para descredibilizar sua capacidade de tomar decisões mais racionais.

Para o homem, houve uma desconexão de suas emoções, dificultando enormemente lidar consigo mesmo e com o mundo ao seu redor. Tornou-se uma panela de pressão prestes a explodir como moeda de troca por sua força e “frieza” emocional.

Esse cenário, certamente, vem mudando e eu gostaria de oferecer minha colaboração para essa mudança, trazendo uma perspectiva do choro como um recurso de manutenção da saúde mental.

Não porque chorar implique em saúde, mas por que reprimir o choro pode implicar no adoecimento emocional. Especialmente quando ele não é devidamente acolhido, principalmente nos bebês e crianças.

Pesquisas já mostraram que bebês que são acolhidos e consolados quando choram, traumatizam menos por conta do estresse e tornam-se adultos menos reativos e mais hábeis em lidar com situações adversas.

5 razões para nunca mais reprimir o choro

Chorar é um fenômeno que ocorre diante da intensidade com que as emoções nos acometem. É resultado de um processo evolutivo aprimorado. Chorar, acima de tudo, é um recurso precioso que pode trazer inúmeros benefícios.

Confira 5 razões para você nunca mais reprimir seu choro:

1. Regulador físico e mental

Ao chorar, nosso cérebro libera neurotransmissores e hormônios que acalmam e regulam a intensidade das emoções, apaziguando a tensão mental.

Há vazão para a pressão interna seja ela ocasionada por emoções positivas ou negativas, melhorando o humor e até mesmo ajudando nas dores físicas, por conta do relaxamento muscular e da liberação de endorfina.

2. Traz clareza e insights

Nem todas as pessoas têm a mesma necessidade de chorar. Algumas choram mais e mais facilmente que outras. Se você é uma pessoa que tem uma maior necessidade de chorar, autorize-se e observe como se sente sempre que chorar.

Chorar muito só é um sinal de depressão quando está acompanhado de outros sintomas. Do contrário, se o resultado após chorar é sentido como alívio, não há com o que se preocupar. Chore sempre que sentir necessidade!

Após chorar, é possível que você encontre soluções que antes não estavam claras. Ao permitir essa descarga emocional, liberamos espaço mental para pensarmos de forma mais criativa e clara, auxiliando na tomada de decisões melhores.

O desespero nos desconecta de nós mesmos e, por isso, deixamos de ver soluções e possibilidades acerca da realidade. O choro pode ter um papel importante neste momento.

3. Aumenta a intimidade consigo e com outras pessoas

Acolher o próprio choro permite um contato mais íntimo consigo mesmo. Quando você se acolhe e compreende o que precisa, você cria uma relação mais profunda com sua criança interior, que muitas vezes está despotencializada e carente.

Acolher o choro é uma forma de reconhecê-la e acalentá-la.

Experimente fazer o exercício de chorar como uma criança: deixe as lágrimas rolarem sem impedimento, abra a boca e vocalize.

Além disso, ao chorar na presença de alguém próximo, laços podem ser estreitados e votos de confiança podem ser estabelecidos. É um sinalizador de intimidade e cumplicidade.

4. Traz ajuda e amparo

Um dos possíveis propósitos evolutivos do choro é ativar a empatia e o impulso de cuidado do outro, isto é, conseguir obter ajuda ou ser poupado de um sofrimento.

Para as mulheres, foi particularmente importante na proteção das crias. É muito mais fácil ser empático e oferecer auxílio quando estamos diante da fragilidade do outro.

Ver uma pessoa chorando costuma afetar a maioria das pessoas que observam. Uma cena triste em que alguém está sofrendo costuma ser, para muitos, uma fonte de mobilização da compaixão.

5. Ajuda a elaborar o luto

Perder alguém querido pode ser traumático. Por isso, realizar o processo de luto é fundamental para gastar e diluir a dor emocional da perda.

O choro pode ajudar no processo de aceitação e entendimento da perda e de como a vida irá mudar a partir desse fato.

Em algumas culturas, a lamúria que é um choro acompanhado de vocalizações faz parte dos rituais de morte como forma de elaborar o acontecimento.

Como acolher o choro

O primeiro passo para acolher alguém que está aos prantos, inclusive você mesmo, é não menosprezar. Não tire sarro ou critique. Não se envergonhe e não se puna. Acolha! Como?

  • Pelo toque

Em geral, as pessoas gostam de receber um abraço ou um toque acolhedor num momento de desespero ou desabafo. Então, pratique o autoabraço e ofereça um abraço se a pessoa gostar de ser tocada. Para garantir que estará fazendo a coisa certa, pergunte antes se pode se aproximar.

Se você não é uma pessoa que aprecia abraços ou toques mais afetivos, experimente apenas pegar na mão, dar um toque no ombro ou fazer um contato visual compassivo. Esses movimentos podem ser significativos para quem está sofrendo.

Um chá docinho, um cobertor e um silêncio respeitoso também podem ser acalentadores.

No caso das crianças pequenas, o colo, o abraço e a presença de alguém confiável é fundamental quando o choro ocorre, especialmente para verificar se o problema que desencadeou o choro pode ser facilmente resolvido.

  • Procure um lugar em que se sinta bem

Se você sente vergonha de chorar na presença de outras pessoas, o melhor é buscar um local em que se sinta bem e possa ter privacidade para chorar livremente.

Chorar sozinho pode trazer mais conforto e serenidade quando a preocupação com o olhar do outro supera o impulso de expressar a emoção.

Mas lembre-se: ter ao menos uma pessoa confiável com quem você possa se expressar pode enriquecer a maneira como você lida com suas emoções. Pode até mesmo ser um terapeuta.

  • Entenda a importância do choro

O ponto aqui não é o quanto se chora, mas o quanto se permite que o choro aconteça quando ele se apresenta. Quando compreendemos o choro como recurso emocional, damos a ele um propósito claro.

A solução dos problemas não se resume a chorar, mas o chorar pode fazer parte da resolução dos problemas. Se você tem muita dificuldade em chorar, não force!

Há outras formas de expressar emoções como a escrita, o desenho, às vezes uma boa conversa traz um enorme alívio sem derramar nenhuma lágrima. Não há certo ou errado e você vai descobrir o que funciona para você.

  • Identifique sintomas além do choro

A depressão não é uma ocorrência isolada ou sem motivos. Diferentemente do choro emocional, o choro pode ser sintomático, ou seja, um sintoma da depressão, e este tipo não gera alívio quando o ocorre.

O choro sintomático é um choro que não cataliza a resolução criativa dos problemas, não regula as emoções ou permite a elaboração do luto, por exemplo.

Não há diminuição da sensação de peso e de angústia, pois a causa do problema é mais profunda e possivelmente mais complexa.

Quando o choro é persistente e a pessoa não consegue conectá-lo aos acontecimentos externos ou internos a ajuda profissional será necessária.

Thaís Khoury

Thaís Khoury

É psicóloga clínica e utiliza a interpretação dos sonhos, a calatonia e a expressão criativa em seus atendimentos. Também é vegana e fundadora do Veganíssimo, empresa que produz alimentos 100% vegetais.

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