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Touro Ferdinando traz reflexões sobre aceitação e questiona crenças

Crenças enraizadas podem nos levar a não aceitação do novo

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A animação Touro Ferdinando, baseado no livro infantil de 1936, “Ferdinando, o Touro”, do americano Munro Leaf e ilustrado por Robert Lawson, é mais um dos candidatos ao Oscar 2018 que promove belas reflexões sobre o universo humano. Nesta animação, na qual os animais são os personagens principais, o protagonista Ferdinando nasce diferente dos outros. Não em aparência, mas em personalidade. Diferentemente dos outros touros, ele não quer lutar e não gosta de violência. Com este simples gesto, introduz um questionamento de crenças e padrões arraigados que são repetidos ao longo das gerações como se fossem o único caminho. Porém, o nosso protagonista traz uma nova perspectiva.

O Touro Ferdinando revela desde o início que é pura bondade e gentileza com todos os seres vivos e ama flores. Durante a história, Ferdinando, passa um tempo mostrando toda sua sensibilidade mesmo se tornando um grandalhão. Contudo, as partes mais tocantes e reflexivas são justamente aquelas nas quais ele se depara com o preconceito das pessoas e também dos da sua própria espécie. Todos que o olham deduzem que deve ser igual a qualquer touro, feroz e pronto para atacar. Em contrapartida, os outros touros o consideram um covarde. Ferdinando precisa mostrar quem realmente é, e que tudo bem ser diferente.

Reflexões sobre aceitação

Uma das reflexões gira em torno da aceitação e aceitar que, mesmo os da mesma espécie, possuem suas individualidades e peculiaridades. Ao olhar para o outro, automaticamente, o julgamos a partir da nossa ótica. Esta atitude, na maioria das vezes, é intrínseca a qualquer ser humano. Entretanto, precisamos permitir que o outro nos mostre quem ele é, não preencher a mente de preconceitos que irão impedir de ver e conhecer o outro tal como é.

Não precisamos ir muito longe para perceber o quanto precisamos caminhar para aceitar as diferenças com mais amor e compaixão. Não fazemos isso, muitas vezes, nem conosco.

Não precisamos ir muito longe para perceber o quanto precisamos caminhar para aceitar as diferenças com mais amor e compaixão. Não fazemos isso, muitas vezes, nem conosco.

A humanidade não está apenas em ser um humano e já vimos ao longo da História o que os homens são capazes de fazer para ter a razão, conquistar territórios e lutar pelo poder. Conviver em harmonia implica aceitar o outro tal como é, incluindo-o em nosso contexto e respeitando sua singularidade.

Crenças enraizadas

Entretanto, além da aceitação, a animação aborda algo ainda mais intrigante. A forma como lidamos com nossas crenças mais enraizadas. Mesmo que todos de sua linhagem familiar sejam de uma maneira, não deve ser isso a determinar quem você é. As crenças mantêm um padrão que gera medo da mudança. Como ser um Touro bondoso é possível para os outros Touros que sempre conheceram apenas as lutas e as touradas? No filme, a mudança de um padrão enrijecido e mantido por gerações causa temor aos animais, inclusive da própria morte. Ao mesmo tempo, são estas mesmas crenças mantidas a décadas que os levam sempre para o caminho da destruição e do abate, ainda que não seja o seu sonho.

Uma das cenas do filme é bem ilustrativa quanto ao poder das crenças enraizadas, quando há uma triste comparação: Ferdinando se depara com uma parede recheada de fotos de Touros que morreram nas arenas e, em outro momento, o Toureiro se vê diante de uma parede similar com toda uma linhagem anterior de Toureiros vitoriosos retratada nas fotos.

Uma reflexão similar também cabe a nós, em nossa lealdade familiar. Muitas vezes não ousamos questionar as regras ou comportamentos uma vez que todos os nossos antepassados agiram de forma parecida. Deixar de seguir um padrão, seja profissional, social ou de relacionamento afetivo, pode nos trazer a sensação de que seremos abatidos.

A morte simbólica dos nossos sonhos reais

Afinal, toda a vida anterior se deu a partir daquele comportamento padrão e atitudes repetidas de geração em geração. Entretanto, é justamente seguir esse padrão que nos causa, muitas vezes, a morte simbólica de nossos reais sonhos, desejos e talentos únicos.

Entretanto, é justamente seguir esse padrão que nos causa, muitas vezes, a morte simbólica de nossos reais sonhos, desejos e talentos únicos.

Muitas vezes estamos tão imersos e presos a nossos padrões que não vemos outra saída a não ser continuarmos agindo da mesma forma conhecida de sempre. Mesmo que traga sofrimento e dor é algo conhecido e portanto mais confortável do que o terror daquilo que desconheço. Ferdinando era visto como medroso, contudo foi o touro mais corajoso por sustentar seus ideais e sonhos de ser ele mesmo até as últimas consequências da escolha.

Assim como Viva – A Vida é uma Festa, da Pixar, essa é uma animação feita para crianças que nos leva a reflexão de gente grande. É ótimo que os pequenos possam ter a possibilidade de refletirem sobre a importância da aceitação das diferenças e de seguir seus sonhos e talentos mesmo que isto os torne diferentes do grupo. Cabe aos adultos fazerem seus próprios questionamentos e propiciarem às crianças um momento de diversão recheado de mensagens importantes para um desenvolvimento mais saudável na sua vida.

Maria Cristina Gomes

Maria Cristina Gomes

É psicóloga sistêmica. Atua com traumas pela abordagem Somatic Experience® além de abordar outras questões de relações interpessoais, autoestima e postura diante da vida. Atende online e presencialmente na cidade de Belo Horizonte.

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