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Ecologia virtual e bem-viver

Tornar o mundo um lugar mais limpo não se restringe só ao mundo físico

Atualizado em

Mais do que nunca, está na moda falar de ecologia. É claro, a questão deveria ser muito mais do que mero modismo, já que o próprio conceito de “moda” implica em algo que passa, é bonito num momento e perde a importância no outro. Apenas o tempo dirá se o processo de tomada de consciência ecológica que ora vivemos é uma verdadeira percepção do que realmente importa, ou se não passa de um impulso por “entrar na onda” da conversa do momento.

O filósofo Felix Guatarri, autor da obra “As 3 Ecologias”, nos apresenta a uma percepção mais elevada acerca do assunto. Mais do que reciclar o lixo e evitar a compra de determinados produtos que não tenham selos verdes, ser ecológico implica em outras esferas de percepção que vão além da realidade biológica. A ecologia também faz parte das relações e da própria subjetividade humana. É pobre reduzir o discurso ecológico à salvação da Amazônia ou dos golfinhos e baleias, se a isso não for incorporada a ideia de uma ecologia das relações, um cuidar de si e do mundo que nos rodeia.

Como tornar a convivência virtual mais ecológica?

Mas se agora escrevo é para falar de algo muito mais simples do que enuncia Guatarri. Simples e importante: a ecologia virtual. Afinal, o meio ambiente virtual (a internet) também é um meio ambiente! Trata-se de um ambiente relacional, um lugar que é ao mesmo tempo um não-lugar, onde estão conectados amigos, parentes, desconhecidos. O que poderíamos aprender, a fim de tornar a nossa vivência neste ambiente mais prazerosa e ecológica?

Eu diria que em primeiro lugar é preciso atentar para uma crítica muito pertinente feita pelo sociólogo Zygmunt Bauman. Ele diz que, se mal usada, a internet é um instrumento que nos aproxima de quem está longe e nos afasta de quem está perto. E o que ele diz é verdade. Muita gente parece estabelecer relações apenas com pessoas que mal conhece e que moram em outras cidades, ou mesmo em outros países. Isso não é um problema a priori, mas passa a ser quando fica evidente que a pessoa não consegue lidar bem com seus relacionamentos próximos. Você já deve ter tido a experiência de sair com um amigo que ao invés de conversar com você num jantar ou almoço, ficou o tempo inteiro mandando mensagens, e-mails ou torpedos de celular para alguém que não estava ali. Além de isso ser muitíssimo deselegante, revela um sintoma delicado: a suspensão da capacidade de interagir com o real. Não que o mundo virtual seja “irreal”, não se trata de uma ambiguidade. Muitas pessoas são mais “elas mesmas” na internet do que na vida real. Mas é de se pensar nos porquês de alguém ser tão bem relacionado virtualmente, mas apresentar dificuldade de conseguir estabelecer vínculos de intimidade ao vivo. Deste modo, pense: você passa mais tempo se relacionando com pessoas que nunca viu? Por que?

Em segundo lugar, é preciso atentar para nossa própria capacidade de gerar lixo virtual. Recebemos diariamente uma enorme quantidade de e-mails absolutamente desnecessários, com correntes, avisos, falsas notícias. Antes de enviar este e-mail para vários amigos, verifique se a notícia procede. Se você não tem tempo de checar se a notícia procede, então não repasse. E se for repassar, ao invés de colocar os endereços eletrônicos todos à vista, utilize o recurso de Cópia Oculta (Blind Copy, que aparece nos e-mails como Bcc ou Cco). Este procedimento é o minimamente cortês quando enviamos mensagens para várias pessoas, pois se a resposta de um não interessar a todos, estaremos poluindo as caixas de mensagens alheias. Por exemplo: João manda um convite de aniversário para 60 amigos, sem usar o recurso de cópia oculta. Marcos responde dizendo que não pode ir, e todos os 59 recebem a mensagem, sendo que muitos nem sabem quem Marcos é, e não estão interessados em saber se ele pode ou não pode ir à festa do João. Se o recurso de cópia oculta é utilizado, apenas João recebe as respostas, o que é mais conveniente, já que elas interessam apenas a João.

Tecnólatras

Há dois tipos de usuários de internet: os que deletam mensagens sem ler, sabendo que elas não são relevantes, e as que abrem e lêem para então deletar. Mesmo que você delete mensagens sem ler, você leva pelo menos 2 segundos para fazê-lo (e isso se você for ágil!). Se você receber uma mensagem inútil por dia (e geralmente é muito mais!), serão 730 segundos perdidos por ano apenas deletando e-mails. Em dez anos, você perdeu duas horas de sua vida apenas se livrando de poluição virtual. Mas o normal é que a pessoa pelo menos delete 10 mensagens inúteis por dia. Isso significa duas horas perdida por ano, ou vinte horas em dez anos! Em 24 anos de uso da internet, você terá perdido dois dias inteiros de sua vida apenas deletando e-mails. É mole? Agora imagine se a pessoa for do tipo que abre e lê, e se depara com uma mensagem absolutamente desnecessária. São dias perdidos em apenas um ano! Enviar mensagens dentro do estritamente necessário é um ato de respeito para com o espaço e o tempo do outro. É claro que o “estritamente necessário” varia de pessoa para pessoa. Tem gente que gosta de receber mensagens de amizade todos os dias. Mas antes de enviar dezenas de mensagens de amizade por e-mail, verifique se a pessoa para quem você envia isso aprecia este tipo de manifestação.

Evidentemente, tal procedimento é diferente quando se trata de um site de relacionamentos como o Facebook, por exemplo. Em sites assim, o usuário pode perfeitamente editar suas configurações de modo a só ler as postagens de alguns de seus amigos, sem se incomodar com eventuais excessivas postagens dos outros. De todo modo, o que está em questão aqui é não apenas o uso do próprio tempo, como também o respeito pelo tempo alheio e o cuidado que deveríamos ter com nossos relacionamentos no mundo real. Desligar o celular quando se vai namorar, ou quando se está no cinema. Jantar com seu amigo sem ter que checar o Facebook no celular o tempo todo.

Há um tempo para o virtual e um tempo para o real, e do mesmo modo que não devemos ser tecnofóbicos, devemos tomar cuidado para não nos convertermos em tecnólatras, venerando a internet mais do que amamos o mundo real. Conectividade, afinal, é um meio, e não um fim em si. E tornar o mundo um lugar mais limpo não se restringe só ao mundo físico. Pense nisso.

Alexey Dodsworth

Alexey Dodsworth

Astrólogo e autor de análises de Astrologia, Tarot e Runas do Personare. Sua afinidade com temas esotéricos se alinha com sua defesa à liberdade de saberes, sejam eles científicos ou não.

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