Amamentação, colo e laços de vínculo materno
A qualidade do contato inicial com a mãe pode definir como caminharemos na vida adulta
Por Alice Duarte
Nós humanos somos seres relacionais e mamíferos. Necessitamos de vínculo, contato e pertencimento. Por essa razão, acredito que a amamentação é um ato sublime.
Em primeiro lugar porque fornece o alimento que mantém e desenvolve a vida no nível físico, com vitaminas, calorias, proteínas etc. Em segundo, porque sustenta o vínculo afetivo: transmite aconchego, proteção, calor e amparo ao bebê.
Seja no peito ou na mamadeira (para as mães que tiveram dificuldades para amamentar), o importante é que o bebê seja nutrido física e energeticamente junto ao corpo da mãe.
Muitos profissionais da saúde, dotados de boas intenções, ainda orientam as mães a realizarem a amamentação de três em três horas, durante 20 ou 30 minutos e intercalando os seios na mesma mamada.
Alegam que dar o peito toda vez que o bebê pede vai deixá-lo “mal acostumado”, ou que vai usar o seio como chupeta.
Fico me perguntando de onde veio a tese das famosas três horas. Obrigar as mães a ficarem controlando o relógio em um período de tanto cansaço, eeestresseee e adaptações às mudanças hormonais, emocionais e psicológicas do puerpério é impor uma racionalização que só atrapalha a tão necessária fusão emocional entre mãe e bebê nessa fase.
Não dá para fingir que não somos animais. Nesse quesito, somos como qualquer outro mamífero. A amamentação é uma oportunidade única de conexão com esse nosso lado primitivo, selvagem e intuitivo.
E, acima de tudo, um ato de amor incondicional. E, como tal, precisa ser oferecido em livre demanda, sem regras rígidas, horários, esquemas e protocolos.
FRÁGEIS E DEPENDENTES
Dentre todos os mamíferos, nós humanos estamos entre os que mais necessitam do vínculo simbiótico com a mãe nos primeiros 24 meses de vida.
Dentre todas as espécies, também somos as que têm o maior cérebro proporcionalmente em relação ao tamanho do corpo.
Para dar tempo de o sistema nervoso amadurecer, os bebês humanos deveriam, em tese, nascer com 12 meses. Isso não acontece porque a cabeça seria tão grande que simplesmente não passaria pela pelve da mãe no momento do parto.
O preço de nascer “antes do tempo”, aos 9 meses, é que os bebês são extremamente dependentes de cuidado.
Segundo a teoria da extero-gestação, do pediatra americano Harvey Karp, nos três primeiros meses de vida o bebê humano é como um marsupial: precisa continuar sendo gestado fora do útero, o mais perto possível da corpo da mãe.
Essa é justamente a fase mais difícil para os pais, pois o bebê demanda muito cuidado, dorme pouco e chora sem razão aparente.
Em culturas ancestrais e em várias tribos indígenas da atualidade, as mães costumam carregar seus bebês o tempo todo próximo ao corpo, em porta-bebês semelhante a um “sling”.
Assim, o bebê quase não chora, pois a mãe está sempre atenta às necessidades de seu filho e ele tem livre acesso ao seio materno.
Hoje o que mais se vê por aí é a indústria empurrando produtos e falsas necessidades de consumo: carrinhos, bebês-conforto, cadeiras de balanço, berços, babás eletrônicas…
Tudo supostamente para facilitar a vida das mães, mas que acabam deixando os bebês separados, perdidos num mundo grande e vazio demais.
É preciso ajudar nossos bebês a se adaptarem ao mundo externo, tentando reproduzir a vida que eles tinham antes do nascimento: corpo encolhidinho, apertado e colado no da mãe, sentindo o seu calor e sua voz, e sendo balançado a maior parte do tempo.
O LEITE E O GANHA-PÃO
Além desses fatores que se interpõem no vínculo mãe-bebê nos primeiros meses de vida, há outra grande ameaça: a pressão da sociedade em cima das mães para forçá-las a voltar precocemente ao mercado de trabalho.
Uma licença maternidade de quatro meses, como praticado na maioria dos casos no Brasil, chega a ser uma violência psicológica tanto para mães como para bebês.
É daí que vem a primeira grande separação emocional da díade, quando a mulher se vê obrigada a buscar uma babá, creche ou o colo de algum outro parente disposto para cuidar do seu filho enquanto ela cuida do ganha-pão.
Isso traz amplas repercussões para toda a vida da criança, segundo a visão sistêmica. Para o bebê humano, a mãe significa o sustento, a vida (lembra de onde vem nosso primeiro sustento como mamífero?).
É com ela que a criança aprende a linguagem do amor, do servir. Tudo o que nos separa do amor incondicional à nossa mãe, aparecerá como obstáculo entre nós e os demais.
Ou seja, se houver movimento afetivo interrompido em direção à mãe na infância, haverá também em relação ao sustento (dinheiro), ao trabalho e ao sucesso na vida adulta.
A questão é delicada. A verdade é que a esmagadora maioria das mães não têm o privilégio de poder parar de trabalhar fora para simplesmente ser mãe, quando assim desejam.
Enquanto a sociedade não caminha para ter políticas públicas que permitam ampliar a licença maternidade, as mães podem adotar pelo menos seis atitudes para fortalecer os laços de vínculo com seus filhos:
Amamente em livre demanda
Não espere seu bebê chorar, sempre ofereça aos primeiros sinais de fome (movimentos de abrir a boca e buscar o peito girando a cabeça, quando chupa os dedos as ou mãozinhas, e ao emitir sons de “maaaaa”). E lembre, livre demanda significa deixar de lado relógio e horários.
Aconchego
Enquanto realizar a amamentação (no peito ou mamadeira), mantenha seu filho pertinho do seu corpo. Se a temperatura estiver agradável, deixe ele só de fraldas, em contato pele a pele com você. Olhe nos seu olhos, converse ou cante para ele.
Atenção Plena
No tempo que puder estar interagindo com o seu filho, não importa se são 15 minutos ou 3 horas seguidas, que seja um tempo de qualidade.
Ou seja, esteja 100% presente e disponível afetivamente para ele. Evite se perder em pensamentos de preocupação com o futuro e remoendo problemas do passado ou se distraindo com coisas ao redor, como TV, ou celular. etc.
Hora do Banho
Dê banho de balde, reproduzindo um mini ofurô, onde seu bebê ficará apertadinho e protegido como na barriga da mãe.
Ou então banhe-o no chuveiro segurando-o no seu colo. Para períodos e regiões frias, essa é a hora ideal para ter contato pele a pele com seu filho.
Sling
Invista num porta-bebês (sling, cadeirinha ou qualquer outro modelo que permita carregar seu bebê colado no seu corpo) e aprenda a usá-lo – em grandes cidades há workshops gratuitos que ensinam diferentes formas de usá-los, além de diversos vídeos educativos disponíveis no YouTube.
Conversa
Quando precisar sair para trabalhar ou se ausentar, converse com seu filho e explique o que você vai fazer, quanto tempo vai ficar fora, por que precisa fazer isso e como está se sentindo.
Ainda que o bebê não entenda a linguagem verbal, ele é mais do que dotado a compreender a linguagem emocional e não-verbal.
Alice Duarte é facilitadora de Constelação Sistêmica Familiar e Organizacional, com treinamentos internacionais com o alemães Bert e Sophie Hellinger, e os espanhóis Joan Garriga e Brigitte Champetier de Ribes. Desde 2015 facilita processos de autoconhecimento, cura emocional e solução de conflitos nos relacionamentos. É jornalista, mantém um site autoral com artigos em português e é criadora do programa online Por Uma Vida Sem Amarras. Vive em Curitiba, onde trabalha com grupos terapêuticos, workshops, cursos e atendimentos individuais (presenciais e online) de Constelação Familiar e Consultoria Sistêmica Empresarial. Aqui no Personare escreve sobre autoconhecimento e relações humanas.
Saiba mais sobre mim- Contato: contato@aliceduarte.com
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