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Sonhos: um assunto íntimo

Compartilhar mensagens do inconsciente com pessoas próximas é saudável

Atualizado em

Muitos leitores têm me enviado sonhos escritos por e-mail e tomando por diretriz a Psicologia Analítica que embasa minha compreensão dos sonhos, achei importante esclarecer a razão de eu não interpretá-los com base em simples descrições, como suponho que seja a expectativa – a qual pode gerar frustrações.

Já lemos em artigos anteriores que os sonhos são expressões do inconsciente que surgem na consciência como imagens simbólicas, que comunicam ao sonhador notícias sobre a totalidade psíquica, ou seja, consciência e inconsciente somados. A principal função do sonho é a de compensar com símbolos aquilo que altera e interfere no equilíbrio da energia psíquica.

Os sonhos falam de nós, daquilo que não percebemos conscientemente em nossa própria personalidade. Por essa razão, os sonhos devem ser tratados com certa reverência. Eles falam de dentro de nós, para nós. Eles são íntimos. São nossos.

Compartilhar sonhos com pessoas próximas é benéfico

O ato de sonhar é, por si só, um regulador da psique. Sonhar e lembrar-se do sonho tem um efeito ainda mais salutar. Sonhar, lembrar e compartilhar o sonho é buscar mais profundidade. Sonhar, lembrar, compartilhar e poder amplificar é compreender uma nova linguagem, a linguagem do inconsciente.

Como nem todas as pessoas que sonham estão em processo terapêutico ou, se estão, podem não utilizar sonhos como material de sessão, compartilho minhas recomendações para poder interpretar um sonho, ainda que não com um profissional.

Compartilhar os sonhos com outras pessoas é muito interessante, mas precisamos lembrar que estamos expondo um pedacinho de nós muito íntimo, muito particular. Por ter essa qualidade mais pessoal e íntima, é recomendável que se compartilhe o sonho com alguém que lhe seja íntimo também. Contar os sonhos pode nos ajudar a perceber dinâmicas e atitudes que temos diante das mais diversas situações. E isso é muito bom, é ficar mais consciente de si mesmo.

Essa recomendação tem o seguinte fundamento: quando contamos um sonho para alguém, estamos sujeitos a ouvir qualquer ideia a respeito dele – e a interpretação que vem do outro pode ser uma grande besteira ou uma ideia muito pertinente. E aí está a importância da intimidade.

Contar o sonho para alguém que nos conhece mais profundamente aumenta as chances de uma troca benéfica de ideias sobre o que se apresenta no sonho, de refletir sobre ele, ainda que não se esteja em um processo de terapia e que não se conheça nada de interpretação de sonhos.

Contar o sonho para alguém que nos conhece mais profundamente aumenta as chances de uma troca benéfica de ideias sobre o que se apresenta no sonho, de refletir sobre ele, ainda que não se esteja em um processo de terapia e que não se conheça nada de interpretação de sonhos.

Quando compartilhamos nosso sonho com alguém que não nos conhece mais intimamente, comentários ou “análises” equivocadas podem causar constrangimento ou levar a um entendimento muito literal do sonho, podendo causar inquietação e angústia, especialmente no caso de sonhos muito intensos e com símbolos muito fortes que abalam o sonhador. Claro que isso pode ocorrer ao contar a alguém íntimo, mas nossa receptividade é diferente nos dois casos. Alguns sonhos podem ser mais óbvios e conseguimos perceber rapidamente do que se trata. Outros demandam mais dedicação.

Contar o sonho serve para poder perceber que dinâmicas ocorrem na vida inconsciente, quais são seus personagens, o que eles representam para nós, em que cenário ele se passa, que ações se explicitam no sonho, assim como as sensações e os sentimentos evocados pelo ato de sonhar. E só essa medida de pensar o sonho já nutre e fornece energia para essa, muitas vezes ignorada, dimensão psíquica.

A análise de sonhos no processo terapêutico

Na clínica, é muito comum trabalhar com os sonhos de meus pacientes e isso só é possível pois na relação terapêutica criamos um vínculo, estabelecemos uma relação profunda e eu posso ouvir a cada sessão a história e todas as construções que envolvem meu paciente. Por termos essa intimidade própria da relação terapêutica é possível, juntos, amplificarmos um sonho, bem como outras imagens que vem em um desenho, de um devaneio ou uma imagem que surge de um trabalho corporal.

A amplificação de um sonho é construída considerando-se as associações que o próprio sonhador faz com os símbolos e as emoções que sente com o sonho, não simplesmente com o que uma outra pessoa (que pode até mesmo ser o terapeuta) pensa ou diz a respeito. Lembremos que o sonho é íntimo, particular e fala de nós. A pessoa para quem contamos o sonho está ali para nos permitir o movimento de nossas próprias ideias, inclusive para concluir que a opinião do outro não tem nada a ver com o que sentimos e isso já começa a nos localizar, pois já sabemos o que o sonho não significa e podemos nos aproximar mais do sentido que ele tem para nós.

Sendo assim, precisamos ter atenção para quem nos mostramos e com quem compartilhamos nossas questões mais íntimas, sejam vindas de um sonho, sejam de situações de nossa vida consciente e concreta. É essencial questionar: para quem eu me exponho? Com quem compartilho o que é íntimo para mim?

Thaís Khoury

Thaís Khoury

É psicóloga clínica e utiliza a interpretação dos sonhos, a calatonia e a expressão criativa em seus atendimentos. Também é vegana e fundadora do Veganíssimo, empresa que produz alimentos 100% vegetais.

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