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Embrace: finalmente confortável na pele em que habito

Documentário provocou em jornalista um despertar para a autenticidade

Atualizado em

Quando assisti ao documentário Embrace (2016) fui envolvida por um forte sentimento de propósito. Passados alguns minutos de filme, eu já balançava a cabeça positivamente, como quem não consegue evitar. Eu me sentia exatamente como todas aquelas mulheres. Eu também não gostava do meu corpo, tinha vergonha de ter mudado ao longo do tempo e me sentia julgada.

Em uma ocasião, minha filha de cinco anos me perguntou porque eu era gordinha. Envergonhada, respondi: “a mamãe come mais do que deve”. Poucos dias depois, vi o filme novamente e, arrebatada, decidi escrever sobre o assunto central deste documentário: como podemos passar a amar a nossa imagem e, em última instância, a nós mesmas? Também enviei uma mensagem a todas as mulheres que estimo recomendando o longa como obrigatório.

A diretora e protagonista, Taryn Brumfitt, é uma australiana, mãe de três filhos, que compartilha do mesmo sentimento: insatisfação com a sua imagem. Motivada a sentir-se melhor consigo mesma e a inspirar outras mulheres, Taryn decide viajar ao redor do mundo e entender porque vivemos numa cultura que desvaloriza a figura feminina somente por seu aspecto e, ainda, porque nós mulheres aceitamos reforçar esta cultura todos os dias.

A pressão por uma aparência sensual em cada etapa da vida e em cada idade é tão opressora que muitas mulheres acreditam nunca alcançar a sua melhor versão “suficientemente magra, jovem, alta, em forma” A escala que mede a suficiência é fruto da representação feminina nas mídias, em que a beleza é retratada, em grande parte, por mulheres que vivem em função dela. Esses modelos, porém, não são suficientemente perfeitos. Seus defeitos são profundamente alterados, para então refletir uma mulher que, portanto, não existe. Tornam-se animações, personagens que podem ser desenhados à revelia do compromisso com a realidade.

Ainda assim, são a representação mais próxima do limitado conceito de beleza de uma mulher padrão: alta, de olhos claros, com mais de 1,70m, cabelos volumosos, seios grandes e firmes, boca carnuda, baixíssimo percentual de gordura, nenhuma celulite e dentes brancos.

É provável que você nem conheça pessoalmente alguém que reúna todas estas características. Provavelmente, este conceito também não representa você nem as mulheres que você ama e admira. E o que é certo é que ele é responsável pela infelicidade de milhões de mulheres. Investimos tempo, dinheiro, energia, humor e um bocado da nossa alma nos comparando com uma ilusão.

Investimos tempo, dinheiro, energia, humor e um bocado da nossa alma nos comparando com uma ilusão.

Não se trata apenas de uma miopia social, mas de uma questão de saúde pública.

Segundo o Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos (NIMH, na sigla em inglês), 70 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de algum tipo de transtorno alimentar. Estima-se que 85% deste público seja feminino. Já de acordo com dados são da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica e Estética (Isaps), somente no Brasil, milhões de mulheres recorrem anualmente a cirurgias plásticas, colocando o país no segundo lugar do mundo a realizar procedimentos, atrás apenas dos Estados Unidos. E há aquelas que perdem a vida para transtornos de humor e de ansiedade, quando o sentimento de insuficiência fica insuportável.

Photographie retouchée

Na França, porém, algumas medidas começam a ser tomadas. Em 2017, foi proibido empregar modelos com peso demasiado baixo e os veículos de mídia que tenham imagens retocadas por programas de edição como o Adobe Photoshop devem conter a mensagem de que não refletem a realidade “Photographie retouchée”. A lei, que prevê multas e até prisão dos empregadores, tem como objetivo combater os altos índices de transtornos alimentares causados pela busca por essa padrão inatingível.

Chegamos a um ponto de virada. Você pode escolher entre a pílula azul e a vermelha. Esta última, a que permite o despertar da Matrix. Embrace me fez escolher a vermelha, me despertou de um sono turbulento, com pesadelos em que eu era sempre a protagonista insegura, perseguida e infeliz. Sei que nunca mais serei a mesma. Minha aparência deixou de ser um atributo que eu permita ser celebrado ou criticado por mim ou qualquer outra pessoa. Meu ideal de beleza passou a ser estar em dia com os meus desejos mais profundos.

Minha aparência deixou de ser um atributo que eu permita ser celebrado ou criticado por mim ou qualquer outra pessoa

Talvez você possa me acompanhar, permitindo-se refletir sobre o quanto este assunto nos absorve. Será que, como eu, algumas decisões na sua vida foram tomadas sob a influência destes parâmetros? Você pode começar sua própria libertação desatando cada nó que a aprisiona. Pretendo afrouxar imediatamente os nós que reprimem as minhas paixões e sustentam a culpa. A minha relação passional com a comida vai encontrar a redenção depois de tanta guerra.

Caminhar, andar de bicicleta e estar em contato com a natureza sempre me fez bem. Agora, não pretendo mais checar a minha performance nos aplicativos, mas me divertir por todo o trajeto. Penso em aceitar os cabelos brancos, que insistem em crescer. Decidi também ser fiel às minhas marcas de expressão, que começam a dar sinal. Afinal, sou uma mulher de 40 anos. Também não vou lamentar ter 40. É incrível eu ter realizado tantas coisas e só ter 40 anos.

E, da próxima vez que a minha filha me perguntar por que eu sou gordinha, a resposta estará na ponta da língua: porque podemos ser o que bem quisermos, meu amor.

E eu escolho ser feliz!

Conheça o projeto

O Body Image Movement foi criado por uma única mulher, mas hoje agrega pessoas de diferentes países para que um número maior delas aceite e respeite os seus corpos como eles são.

Assista ao trailer oficial abaixo:

Mariana Daemon

Mariana Daemon

Mariana é jornalista por formação, chef autodidata por paixão e empresária por ousadia. Há dois anos dedica-se a cozinhar um pouco de tudo e a criar suas próprias receitas. Assim nasceu a sua empresa de gastronomia, a Un peu de tout. Atualmente, mora em Lisboa, Portugal, e espera inspirar as pessoas a realizarem o que desejam.

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